Blog Núcleo Semente

O Blog do Núcleo Semente tem por objetivo ampliar o espaço de divulgação e discussão de temas relacionados ao mundo do Trabalho, da Saúde Mental e dos Direitos Humanos. Está aberto à colaboração de todxs os membros do Núcleo e de pesquisadores e pessoas de outras áreas que tenham interesse nessas temáticas. Equipe responsável: GT Comunicação e Difusão: Ana Yara e M Laurinda R Sousa.

    Em 2003, no dia 28 de abril, realizou-se, no Brasil, o primeiro ato oficial para chamar a atenção para o significado dessa data, reconhecida internacionalmente como Dia Internacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho. Neste ano, 2024, o ato, nomeado Ato e Canto pela Vida, foi realizado na Praça Vladimir Herzog com a participação da Fundacentro, do Núcleo Semente e de vários movimentos sindicais. O relato que se segue foi escrito por Cristiane Oliveira Reimberg, que faz parte da equipe da Fundacentro e também do Núcleo Semente.

Ato e Canto pela Vida. 28 de Abril de 2024. Dia Internacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho.


   Na escadaria da Praça, frases grafadas nos degraus clamam por liberdade e nos lembram que a autonomia é essencial para a realização da atividade de trabalho. O nome do local escolhido para o evento também traz o símbolo da luta e da justiça ao homenagear o jornalista Vladimir Herzog, assassinado durante a ditadura militar, por cumprir seu dever profissional de informar os cidadãos. No dia 28 de abril, esse espaço foi ocupado pelo povo para o Ato e Canto pela Vida, que celebrou em São Paulo/SP o Dia Internacional em Memória dos Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho.

    Trabalhadores e trabalhadoras de diferentes categorias profissionais, de instituição públicas e privadas, de movimentos sociais, estiveram lá para denunciar os números de acidentes e doenças ocupacionais. Estima-se que, a cada 15 segundos, uma pessoa morre no mundo por esse tipo de acidente. No Brasil, a cada 50 segundos, um acidente de trabalho é notificado. Quem passou por lá recebeu o Manifesto do Dia Internacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho - Ato e Canto pela Vida - Basta de sofrimento e morte!, assinado por mais de 40 instituições, entre elas, a Fundacentro.

    O documento denuncia: “Na última década, entre 2012 e 2022, cerca de 7 milhões de acidentes do trabalho foram notificados no país, gerando mais de 2 milhões de afastamentos e causando cerca de 27 mil mortes de pessoas que saíram das suas casas”.  Ainda há todo um universo de acidentes e doenças relacionados ao trabalho não registrados, devido à subnotificação e à informalidade.

    “Esses números referem-se ao mercado formal de trabalho, não incluindo os acidentes dos trabalhadores e das trabalhadoras sem registro em carteira, geralmente submetidos às condições de trabalho mais insalubres e perigosas e cujas mortes são ainda mais invisibilizadas”, explica o Manifesto.

    “A realização desse ato, em praça pública, em diálogo com a população mais ampla e com a organização conjunta de mais de 40 entidades, foi muito importante. Os acidentes de trabalho seguem ocorrendo diariamente, matando, lesionando, comprometendo milhões de vidas em todo o país, e nossa missão é não permitir nunca que esse tema deixe de ter a centralidade que precisa ter”, afirma o presidente da Fundacentro, Pedro Tourinho.

    O evento também foi espaço para cantar em defesa ao direito à vida, regado pelos sambas entoados por Paulinho Timor e Inimigos do Batente. Os músicos separaram um repertório que retrata a vida de trabalhadores e trabalhadoras, como em Identidade, de Ederaldo Gentil: “05342635 é o meu número o meu nome / Minha identidade / Mínimo salário é o meu ordenado / 12 horas de trabalho / Que felicidade, que felicidade”.

    Depois da cantoria, veio a homenagem aos mortos pelo trabalho, com a cerimônia da vela, conduzida por Nilton Freitas, representante regional América Latina e Caribe da ICM (lnternacional dos Trabalhadores da Construção e Madeira). “Em todo mundo, atos como esses estão sendo realizados por trabalhadores e trabalhadoras. A origem do 28 de abril vem de um acidente em uma mina nos Estados Unidos, em 1969, com 78 mortos. Depois nos anos 1990, o movimento sindical internacional, liderado pela Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres, começou mobilizar as centrais sindicais de todo mundo para marcar esse dia, principalmente nas reuniões da ONU [Organização das Nações Unidas], porque estava sendo construída a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. O objetivo número 8 é o trabalho decente. Isso foi crescendo de 1997 a 2002, em todo o mundo. Em 2003, foi realizada a primeira cerimônia oficial [no Brasil], na Fundacentro”, recorda Nilton Freitas, que na época presidia a instituição.

    O ato buscava ter essa característica de luto e luta, o que se mantem até hoje. “A data é importante para recuperar a democracia no local de trabalho”, acredita o diretor de Conhecimento e Tecnologia da Fundacentro, Remígio Todeschini. “Só melhoraremos as condições de trabalho na medida em que fortalecermos as comissões de trabalhadores e a participação ativa na Cipa [Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio]”, completa.
    Todeschini ainda defendeu a integração das políticas e o fortalecimento das instituições públicas. “A Fundacentro precisa ser reconstruída com concurso e com mais verbas para pesquisa, os Cerests [Centros de Referência em Saúde do Trabalhador] precisam ser ampliados com mais verbas no âmbito da Saúde. É preciso haver uma integração de ações entre Saúde, Previdência e Trabalho”, aponta o diretor.

    .A união foi marca do ato e esteve presente na fala da coordenadora do Fórum Nacional das Centrais Sindicais em Saúde e Segurança da Trabalhadora e Trabalhador, Cleonice Caetano: “Temos aqui a música, mas também dizemos que a cada 15 segundos no mundo morre uma pessoa de acidente do trabalho e no Brasil a cada 3 horas e meia. Queremos com essa união conscientizar toda uma sociedade, a classe trabalhadora para que se defenda do ambiente insalubre do trabalho, e a classe patronal, que tenha essa consciência de que se tiver um ambiente saudável terá mais produtividade e pessoas mais felizes trabalhando”.

    Que o mundo do trabalho possa ter o espírito do Ato e Canto pela Vida. Na Praça Vladimir Herzog, onde todos eram iguais, o almoço, Baião de Dois, foi dividido, servido no sistema “Quem pode, paga, quem não pode, pega”. Lá tradicionalmente ocorre uma vez por mês o encontro  gastronômico-cultural “Todo mundo tem que falar, cantar e comer!”. A arte esteve presente, além da música, na construção coletiva da Árvore da Vida, em que todos puderam colocar a marca de suas mãos, aquelas que fazem a máquina do trabalho girar. Como diz o Manifesto, “Basta de sofrimento e morte! Viva a vida!”.

This entry was posted on 29 maio, 2024. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.

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